Tigre de papel: considerações sobre a ansiedade e os ataques de pânico

A expressão “tigre de papel” tem a origem na expressão chinesa “zhilaohu”, algo aparentemente poderoso e ameaçador, mas, na realidade, inofensivo. Recentemente, vi esta expressão a ser utilizada enquanto metáfora para os ataques de pânico e reconheci o seu potencial para facilitar uma melhor compreensão destes fenómenos da ansiedade.

A expressão “tigre de papel” tem a origem na expressão chinesa “zhilaohu”, algo aparentemente poderoso e ameaçador, mas, na realidade, inofensivo. Uma metáfora conhecida e utilizada em vários contextos. Recentemente, vi esta expressão a ser utilizada enquanto metáfora para os ataques de pânico e reconheci o seu potencial para facilitar uma melhor compreensão destes fenómenos da ansiedade. Na sua justa medida, a ansiedade é uma experiência emocional importante e necessária pela sua função protetora, por manter o nosso estado de alerta devidamente apurado para potenciais ameaças e para promover respostas adequadas face às adversidades. Quando assim é, podemos considerar que estamos perante uma experiência de ansiedade dita normal e adaptativa. Além destas fronteiras, reside a ansiedade patológica: sentimentos persistentes de tensão, preocupação e medo, sob a forma de preocupações excessivas frequentes e difíceis de controlar, em que o risco e o perigo percecionados são desproporcionais à realidade; a presença de sintomas físicos de desconforto e mal-estar, e sofrimento psicológico, que expõem a pessoa a sentimentos de maior vulnerabilidade pelo desequilíbrio entre as exigências e os recursos internos disponíveis, com prejuízo do funcionamento quotidiano. Por sua vez, os ataques de pânico são episódios súbitos, por vezes sem causa aparente, de ansiedade extrema, medo e desconforto intensos, que atingem o seu pico em poucos minutos, acompanhados de sintomas físicos bastante desagradáveis e pensamentos muito angustiantes. Pela experiência física e emocional avassaladora, prevalece a sensação de perigo iminente e a antecipação de acontecimentos mais catastróficos e dramáticos, cercados pelo medo intenso e, por vezes, aterrorizador. Tudo isto, em minutos: episódios rápidos com princípio, meio e fim, mas que parecem pertencer a uma dimensão paralela em que espaço, tempo e perigo estão dissociados da realidade. Após esta experiência, pode seguir-se uma preocupação persistente com a possibilidade de repetição – o medo de ter medo – e provocar mudanças desadaptativas no comportamento, sobretudo de evitamento, com potencial limitador e incapacitante. Voltemos agora ao tigre de papel: aparentemente poderoso e ameaçador, mas, na realidade, inofensivo. Sem desconsiderar o impacto real das preocupações ruminantes da ansiedade e do medo intenso sentido nos ataques de pânico e, sobretudo, o sofrimento psicológico subjacente a estes fenómenos, proponho desconstruir esta metáfora pelo seu potencial transformador. O sofrimento é real, mas a ameaça percecionada pode ser feita de papel, mais frágil, facilmente desmascarada pela realidade. Estas experiências podem gerar expectativas e antecipações apreensivas que ampliam a sensação de perigo para uma dimensão irreal. Na verdade, são sinais de alerta, mensagens subliminares, que precisam ser decifrados: sinal para parar, pedir ajuda, traduzem necessidades e desejos à espera de serem acolhidos. As emoções têm um potencial de crescimento e de transformação, mesmo as mais negativas, e ao evitarmos a sua expressão estamos a distanciar-nos da nossa autenticidade. Isto é válido para lidar com a ansiedade, sendo certo que não há receitas mágicas e soluções imediatas, mas sim a procura de um equilíbrio entre aceitar e conter as nossas emoções. A luta frenética contra a ansiedade pode ser desgastante e contraproducente. É importante abandonar a necessidade de controlo e aceitar a ansiedade, dar-lhe espaço; permitirmo-nos estar em contacto mais direto com as nossas emoções, dar lugar à sua expressão e compreensão, favorecendo uma convivência mais harmoniosa e a mobilização de recursos internos mais adaptativos. Quando cruzamos caminho com sensações mais intensas de ansiedade, podemos lembrar-nos da metáfora do tigre de papel – parece assustador, mas, na realidade, pode ser inofensivo. Talvez assim se torne mais fácil encontrar disponibilidade para interpretar os sinais e tomar consciência da mensagem nas entrelinhas – a verdade das nossas necessidades e o nosso potencial de resiliência.