Perguntas e respostas sobre as consultas de psicologia

Com o devido respeito pela diversidade de abordagens de intervenção, nas suas diferenças e potenciais, as respostas que apresento referem-se à minha prática profissional e servem o propósito de esclarecer e desmistificar o processo terapêutico nas consultas de psicologia.
Quero partilhar algumas perguntas e dúvidas que identifico como mais frequentes em torno das consultas de psicologia. Com o devido respeito pela diversidade de abordagens de intervenção, nas suas diferenças e potenciais, as respostas que apresento referem-se à minha prática profissional e servem o propósito de esclarecer e desmistificar o processo terapêutico nas consultas de psicologia.
Quando pedir ajuda?
A iniciativa e motivação para começar um processo terapêutico varia de pessoa para pessoa e obedece a ritmos muito próprios. Geralmente, a necessidade surge quando nos sentimos presos em padrões de comportamentos ou ciclos disfuncionais, ou quando os recursos que temos não estão a ser suficientes para lidar com as dificuldades sentidas. Quando o que sentimos e pensamos causa sofrimento significativo e interfere negativamente no nosso quotidiano e relações. Também podemos recorrer a este tipo de ajuda quando queremos conhecer-nos melhor, investir no nosso desenvolvimento pessoal e aprimorar recursos internos.
Como funciona?
O processo começa com uma primeira consulta para acolher e contextualizar o motivo do pedido e o enquadramento na história de vida. Constitui uma observação geral onde são estabelecidos os objetivos preliminares e são definidas e esclarecidas as especificidades do processo (abordagem, frequência e duração). As consultas seguintes dão lugar à exploração mais amiúde das problemáticas emergentes, ao envolvimento no processo e ao estabelecimento da relação terapêutica. Ao longo do tempo vai-se construindo uma relação de confiança, consistente e segura, de aceitação positiva e de respeito pelo ritmo da pessoa. Na continuidade do processo terapêutico constrói-se o lugar de compreensão e elaboração do sofrimento psicológico, do significado dos sintomas e da identificação de padrões de comportamento e relacionais. Abre-se caminho para potenciar a organização do pensamento, a regulação das emoções e o desenvolvimento de recursos internos mais adaptativos. Existe sempre oportunidade para discutir a evolução e a forma como o processo está a ser vivido, fazer pontos de situação e olhar em conjunto para os objetivos estabelecidos e os progressos sentidos. À medida que as melhorias se vão tornando mais evidentes, nomeadamente, quando se restabelece o equilíbrio psíquico e a estabilidade emocional, começa a ser preparada a alta e o encaminhamento gradual para o término do processo terapêutico.
Porquê recorrer à ajuda de um psicólogo?
A especificidade da ajuda profissional prende-se com as competências técnicas de empatia, escuta ativa, análise e interpretação. Uma presença disponível, uma perspetiva imparcial e um olhar atento para o mundo interno, no que é manifesto e latente, consciente e inconsciente, e que é acolhido e aceite incondicionalmente numa relação segura. Mais do que desabafar e partilhar, é entrar em comunicação connosco próprios com a ajuda do psicólogo. Uma linguagem própria da relação terapêutica – a linguagem do mundo afetivo – construída em conjunto, com ressonância no mundo interno e potencialmente transformadora.
Quanto tempo dura?
Importa esclarecer que o acompanhamento psicológico é um processo gradual, que exige continuidade e consistência para que se verifiquem melhorias significativas. A duração varia em função das problemáticas ligadas ao pedido de intervenção, dos objetivos estabelecidos à partida e ao longo do caminho, das abordagens utilizadas pelo psicólogo e da evolução do processo. Estes fatores são determinantes e diferentes para cada pessoa – por isso, a conhecida expressão “cada caso é um caso” –, razão pela qual a duração pode ser variável e imprevisível.
Com que frequência?
Pela natureza gradual do processo, as sessões devem ter uma frequência idealmente semanal, sobretudo numa fase inicial. Inicialmente, para dar tempo e espaço para o envolvimento da pessoa e fortalecimento da relação terapêutica. A continuidade prende-se com a necessidade de dar consistência ao trabalho realizado e garantir uma disponibilidade assídua no acolhimento das fragilidades e vulnerabilidades, e no acompanhamento da evolução. A frequência pode ser ajustada de acordo com as necessidades de intervenção e disponibilidade da pessoa, de forma a que as exigências da sua realidade e rotinas não interfiram negativamente no processo.
O que esperar das consultas?
A relação terapêutica é um espaço de autoconhecimento, onde as capacidades e vulnerabilidades são expostas e acolhidas num ambiente seguro e contentor. Um espaço de respeito pela individualidade, privacidade e ritmo da pessoa, enquadrado na confidencialidade e sigilo profissional. A conjugação entre imparcialidade, empatia, disponibilidade e aceitação incondicional. Não há receitas mágicas e soluções imediatas. Há tempo para identificar necessidades, compreender fragilidades, estabelecer limites e desenvolver novos recursos. Lugar para falhar, repetir e reparar. Há espaço para quebrar barreiras, explorar resistências e promover uma relação de maior autenticidade consigo mesmo. O papel do psicólogo não se sobrepõe ao potencial da pessoa para encontrar o seu caminho e assumir um papel mais autónomo e responsável pela sua vida. Há compreensão e validação, mas também reforço da capacidade de resiliência e da responsabilidade pelo próprio processo de mudança. A comunicação é essencial, não só para partilhar inseguranças e conquistas, mas também para rever evolução e expor receios e dúvidas.
Pedir ajuda é sinal de fraqueza?
Pelo contrário, pedir ajuda significa ter a capacidade para reconhecer os nossos limites e sinal de que estamos dispostos a cuidar de nós, a escutar as nossas necessidades e a responsabilizarmo-nos pelo nosso equilíbrio e bem-estar. Se vamos ao médico quando temos uma perna partida, porque não haveríamos de ir ao psicólogo quando a ansiedade toma conta de nós? Importa desconstruir preconceitos: ser forte não é não sentir nada e vulnerabilidade não é falha ou incompetência.
Qual é o diagnóstico?
O enquadramento numa determinada psicopatologia não é uma condição essencial para o início de um acompanhamento psicológico nem necessariamente o ponto de partida para o trabalho terapêutico. O conceito de psicopatologia está muito associado ao diagnóstico a partir dos sintomas observados e avaliados, com base em referenciais normativos. Nem sempre é possível ou necessário fazer este enquadramento mais formal. Outras vezes estamos perante um quadro clínico com comorbilidades. Noutras tantas, a sintomatologia não se enquadra numa patologia específica e, apesar de representar sofrimento significativo, não encontra lugar de codificação formal enquanto psicopatologia. Acima de tudo, predomina o cuidado rigoroso na observação e avaliação dos sintomas e critérios de diagnóstico, descartando a banalização destes conceitos, e desmistificando o estigma e os preconceitos associados. O enquadramento clínico do funcionamento psíquico é importante para que possam ser estabelecidas necessidades de intervenção. Este enquadramento vai além da lista de sintomas e da identificação de um diagnóstico. Importa conhecer e explorar o funcionamento psíquico da pessoa em questão, no seu todo, e de acordo com a sua história, experiências e vivências. Quando falamos de diagnóstico, a resposta não se encontra nas palavras “doença”, “tratamento” e “cura”, sendo mais acertado falar de “funcionamento psíquico”, “intervenção” e “mudança”. O diagnóstico é mais que um nome e corresponde ao esclarecimento do padrão de funcionamento, na sua diversidade de comportamentos, pensamentos e emoções. Reconhecendo a necessidade e importância de dar significado ao sofrimento, é essencial que essa resposta seja dada e esclarecida de acordo com a sua pluralidade e sem atribuições precoces, forçadas e limitadoras.
Preciso de medicação?
Se verificar necessário, o psicólogo pode sugerir o encaminhamento para outras especialidades, como a psiquiatria. A necessidade e prescrição de medicação é avaliada na especialidade médica correspondente e não cabe à psicologia. No caso da medicação psiquiátrica, é da competência do psiquiatra avaliar o caso em questão, a necessidade ou não de terapêutica farmacológica e o seu devido acompanhamento. A psicologia e a psiquiatria funcionam muitas vezes em coordenação, mas são especialidades distintas que não se substituem, independentemente da gravidade do quadro clínico.
Porque é que o psicólogo não deve atender pessoas próximas entre si, como familiares ou amigos?
De acordo com o código deontológico da Ordem dos Psicólogos Portugueses, os psicólogos não devem estabelecer uma relação profissional com pessoas próximas dos seus clientes, nem desenvolver outro tipo de relação, além da profissional, com os seus clientes. Da mesma forma, não devem estabelecer uma relação profissional com quem mantenham ou tenham mantido uma relação prévia de outra natureza. O estabelecimento de relações múltiplas interfere na relação terapêutica em vários níveis: a existência de múltiplas fontes de informação, em que o psicólogo tem acesso a informação a partir de outros contextos ou de outras pessoas relacionadas, o que pode limitar a liberdade do cliente em contar o que quiser ou aquilo que estiver preparado para contar ao psicólogo; interfere na relação de confiança entre psicólogo e cliente e nas questões de privacidade do cliente; pode dar origem a um conflito de interesses; pode prejudicar a isenção com que o psicólogo deve exercer a sua profissão. A confiança é a base essencial para o exercício da prática da psicologia, e esta pode ficar condicionada pelo impacto de relações externas e pela informação acedida nesses contextos, fora do terapêutico, interferindo no sucesso da intervenção.
Como saber se a terapia está a funcionar?
Existem vários fatores e situações que podem ser bons indicadores de que o acompanhamento psicológico e as abordagens utilizadas estão a ser proveitosas. Tratando-se de um processo gradual que obedece a um ritmo subjetivo, é natural que os efeitos e mudanças não sejam imediatamente evidentes. Também pode ser necessário um esclarecimento e reajuste das expectativas de determinados resultados. Podemos considerar que um dos primeiros indicadores constitui a identificação e empatia com o psicólogo. Além disso, a adesão positiva, traduzida no envolvimento da pessoa no processo, mesmo que existam dias em que há menos vontade ou motivação para ir à consulta, ou momentos de maior questionamento ou dúvida sobre o processo – isto também é normal e, muitas vezes, expectável, não sendo necessariamente um indicador negativo. Outros fatores dizem respeito à redução da sintomatologia inicial, à melhoria dos sintomas, a diminuição do desconforto e do sofrimento e à utilização de mecanismos de defesa mais adaptativos e construtivos. Por fim, os indicadores mais desejados são quando se verifica mudança e transformação positiva na representação que a pessoa tem de si própria, e quando alcança maior autenticidade na relação consigo, com os outros e com o mundo à sua volta.
Como se processa a alta?
O término do processo terapêutico não deve acontecer de forma radical e deve ser previamente preparado e trabalhado. Começa com o espaçamento gradual da frequência das consultas, para que a pessoa vá experimentando os seus recursos de forma autónoma ao longo do tempo. Pode acontecer que a ideia de concluir a terapia desperte sentimentos de ansiedade, zanga, tristeza ou angústia, e isto pode ser partilhado e elaborado nas consultas. Muitas vezes, o término da terapia é sinónimo de desafios superados, conquistas acumuladas e, acima de tudo, crescimento psíquico e estabilidade emocional, num percurso protagonizado pelo próprio no seu investimento e mérito devido.