Notas sobre a resiliência

É a capacidade de resistir às adversidades, mas também pode ser a capacidade de adaptação às mudanças que se impõem, abrindo caminho para um processo de crescimento e renovação.
Ando às voltas com a palavra resiliência. Está em todo o lado: cá dentro, perto de mim e em lugares mais distantes. A correria dos dias, as pessoas com quem me cruzo, as histórias próximas e as que vejo passar nos ecrãs sobre o mundo – tão longe e tão perto – levam-me a crer que a resiliência é multifacetada e dotada de muitos ofícios. Seja na forma de resistência ou de recuperação, traduz uma mensagem de esperança no caminho de regresso ao que estava inteiro ou no encontro com as partes mais frágeis que precisam de ser cuidadas na reconstrução. O prefixo é o mesmo para todas estas palavras, comum aos verbos que atuam nestes processos, e parece aludir à importância de voltar atrás, fazer de novo e reforçar. É ir e voltar, cair e levantar. É a capacidade de resistir às adversidades, mas também pode ser a capacidade de adaptação às mudanças que se impõem, abrindo caminho para um processo de crescimento e renovação. Por vezes, a mola estica tanto que já não consegue voltar à sua forma original, mas pode adquirir novas formas e funcionalidades – ciências físicas e mecânicas à parte. Olhar este conceito à luz da condição humana é compreender a possibilidade de que os obstáculos e traumas podem ser superados a partir de uma reorganização interna potencialmente transformadora. Ultrapassa a noção de resistência e permite-nos aceitar a eventualidade dos danos, mas também a capacidade de recuperação. A estrutura abala, a história muda, mas podem existir percursos alternativos e terreno fértil para novos significados e narrativas. A nossa capacidade de adaptação é muitas vezes subestimada, sobretudo por nós próprios e quando a luz ao fundo do túnel está ainda longe do nosso alcance. É no caminho, entre trilhos labirínticos, nos cruzamentos de possibilidades e escolhas, que vamos encontrando alternativas, mais acertadas ou mais dúbias, com mais ou menos segurança e convicção – um passo de cada vez, para trás e para frente, na procura de sentido e rumo. E lá vamos nós, inquietos e com medo, munidos de coragem, explorar o mapa, partir pedra e renascer. Não pretendo florear o processo árduo e potencialmente doloroso de uma possível recuperação, mas sim reforçar a matéria de que somos feitos em termos de resiliência, numa perspetiva de alento e esperança.